A QUESTÃO DA CAXEMIRA
Introdução
Desde o ano 2002 as disputas envolvendo a Índia e o Paquistão
retomaram as manchetes dos jornais, depois de quase dois anos de cessar fogo oficial.
Completavam-se 50 anos de conflito entre os dois países, que passou a ser visto
como uma ameaça internacional na última década, devido ao fato de os 2 países
possuírem armas nucleares. Essa situação de beligerância tendeu a aumentar,
pois, ao mesmo
tempo em que as ações dos grupos radicias retomaram os ataques, a tendência que abriga o "separatismo pacífico" sofreu um grande revés com o assassinato do líder separatista Abdul Gani Lone, que esteve em Dubai em dezembro e reuniu-se com líderes moderados para achar formas pacíficas de lutar pela libertação da Caxemira. Nos últimos anos Lone modificou sua posição política, defendendo que os militantes islâmicos estrangeiros deveriam deixar a região e que os habitantes da Caxemira deveriam decidir e liderar sua própria libertação; julgava que as disputas na região só poderiam ser resolvidas com negociações.
tempo em que as ações dos grupos radicias retomaram os ataques, a tendência que abriga o "separatismo pacífico" sofreu um grande revés com o assassinato do líder separatista Abdul Gani Lone, que esteve em Dubai em dezembro e reuniu-se com líderes moderados para achar formas pacíficas de lutar pela libertação da Caxemira. Nos últimos anos Lone modificou sua posição política, defendendo que os militantes islâmicos estrangeiros deveriam deixar a região e que os habitantes da Caxemira deveriam decidir e liderar sua própria libertação; julgava que as disputas na região só poderiam ser resolvidas com negociações.
No entanto, apesar da existência de grupos que defendem a
autodeterminação sem a utilização da guerra, essa é atualmente a tendência com
menor probabilidade de vitória, na medida em que o governo da Índia se recusa a
estabelecer qualquer tipo de discussão nesse sentido.
O NEOCOLONIALISMO
Na segunda metade do século XIX a Inglaterra intensificou e
reordenou sua política expansionista, conseqüência do novo modelo de
desenvolvimento capitalista imposto pela Segunda Revolução Industrial.
A expansão do processo de industrialização para novos países,
acirrando as disputas por mercados; a formação de conglomerados empresariais
(cartéis, trustes e holdings); a depressão econômica e a organização dos
trabalhadores e de suas reivindicações, contribuíram para o desenvolvimento do
imperialismo.
O imperialismo, do ponto de vista da estrutura capitalista,
foi um fenômeno típico do final do século XIX, quando da expansão dos países
industrializados sobre territórios da África e Ásia. Esse processo implicou na
existência de uma situação de hegemonia da burguesia sobre o Estado - na França
e Bélgica após a revolução de 30, nos Estados Unidos após a Guerra Civil
(1865), na Alemanha e Itália principalmente após a unificação (1871) e no Japão
a partir da Revolução Meiji (1868) -, no desenvolvimento do capitalismo
monopolista, e numa política de ação que combinou um processo complexo de
dominação, envolvendo não apenas a conquista militar de territórios, mas o
controle sobre sua economia e organização política, utilizando-se para isso, de
imposições culturais, religiosas e de organização social, ou seja, uma
dominação completa e complexa.
"O imperialismo é filho da industrialização. Nos países
ricos, onde o capital abunda e se acumula rápido, onde a indústria se expande
de forma constante (...), onde a agricultura inclusive deve mecanizar-se para
sobreviver, as exportações constituem um fator essencial para a prosperidade
pública e as oportunidades para o capital e a demanda de mão-de-obra refletem a
magnitude do mercado externo". (Jules Ferry, primeiro ministro da França
na década de 1880)
Para justificar a ação imperialista apresentaram-se razões
humanitárias, que deram origem a Teoria do "Fardo do Homem Branco",
segundo a qual, as nações mais adiantadas tinham uma missão civilizadora a
cumprir: levar o progresso às regiões mais primitivas, onde ele não poderia se
desenvolver sozinho. Caberia ao "homem branco" livrar a África do
canibalismo e do primitivismo. A pseudo ciência também foi utilizada para
justificar a superioridade racial do homem branco em relação ao homem
não-branco e a expressão "darwinismo social"tornou-se comum entre os
defensores do imperialismo.
As colônias podiam ser de dois tipos: Colônias de
Enraizamento, marcada por imigração do colonizador em larga escala, que então
ocupa as terras da região colonizada, e Colônias de Enquadramento, onde o
colonizador controla a vida político-administrativa, sem expropriar as terras,
explorando o trabalho nativo. Havia ainda os protetorados
A Inglaterra foi o país que mais regiões na Ásia e África
colonizou. Podemos dizer que o neocolonialismo praticado pela Inglaterra, na
maioria dos casos, foi "de enquadramento". Na Índia, percebemos a
passagem de Protetorado para colônia de enraizamento. Na região a presença
européia remonta ao século XVI com a chegada dos portugueses e seu domínio
sobre algumas regiões. No século XVIII, holandeses, franceses e ingleses
lutaram pela região e a dominação inglesa começou a definir-se em 1757, com a
vitória de Robert Clive, representante da Companhia Inglesa das Índias
Orientais, sobre os holandeses e, em 1763, sobre os franceses, quando o Tratado
de Paris assegurou a supremacia inglesa na região. No século seguinte uma série
de guerras garantiu o domínio inglês sobre quase toda a Índia, apenas alguns
principados autônomos foram preservados, e após esmagarem o Grande Motim
(Revolta dos Cipaios), a rainha Elizabeth foi proclamada imperatriz da Índia
A DESCOLONIZAÇÃO DA
ÍNDIA
A crise econômica do final do século XIX, que atingiu os
países industrializados, produziu efeitos desastrosos na Índia, provocando
fome, epidemias rebeliões camponesas, fato que estimulou ainda mais o
sentimento nacionalista.
Em 1885 fundou-se o Partido do Congresso Nacional Indiano,
que teria grande importância no processo de independência da Índia. Nesse
período, "Mahatma" Gandhi estudava direito na Inglaterra e
posteriormente viveu na África do Sul, onde fundou uma seção do Partido do
Congresso e definiu seus princípios políticos, lutando pelos direitos dos
indianos através do satyagraha - resistência pacifica baseada nos princípios da
luta sem violência e no sofrimento como instrumento para resistir ao
adversário.
O Partido do Congresso reunia setores elitizados da sociedade
indiana e representava em especial os Hindus. Esse fato alimentou
constantemente uma contradição, na medida em que diversos setores da sociedade
indiana não pertencem a essa religião. Hinduísmo é um termo genérico usado para
designar a religião dos hindus, é politeísta, pressupõe a divisão da sociedade
em castas, rigidamente estratificada, onde as diferenças são reforçadas;dessa
maneira, o Partido acabava por defender os direitos de liberdade da Índia
frente ao domínio britânico, porém não garantia a grande parte da população,uma
situação diferente daquela existente até então.
Na década de 20 Gandhi tornou-se o principal expoente do
Partido e da luta contra a dominação inglesa. Entre 1922 e 24 foi preso por
defender a não-violência e a não-cooperação com os ingleses. Em março de 1930
liderou o "protesto do sal", que teve como resultado a prisão de mais
de sessenta mil pessoas. Nesse período já se sentia a divisão interna no
partido do Congresso entre hindus e muçulmanos.
"No sistema hindu, a ordem social esta fundada na
desigualdade social, Istoé, o sistema de castas criou uma série de camadas
sociais, desde a mais alta até a mais baixa, composta de pessoas que haviam
recebido a mesma situação de seus pais. As hierarquias no sistema hindu se
definem, portanto, em função da geração e não do indivíduo. Assim, as castas
impediam toda e qualquer ascensão social. Embora independentes da religião, as
castas devem a ela sua rigidez. Daí as pessoas de baixas castas rapidamente se
converterem ao islamismo (...) fugindo da pior miséria social".
(Letícia Bicalho Canêdo - A Descolonização da África e da
Ásia, pág 26)
No processo de luta pela independência, que se intensificou
durante a Segunda Guerra Mundial, hindus e muçulmanos romperam politicamente e
esses últimos organizaram a Liga Muçulmana, liderada por Mohamed Ali Jinnah,
representando cerca de 24% da população.
A DIVISÃO DA REGIÃO
Ao final da Segunda Guerra Mundial foram se desenvolveram
negociações entre os representantes do Partido do Congresso e o governo inglês.
Ao mesmo tempo ampliavam-se os conflitos internos entre hindus e muçulmanos e
os massacres de ambos os lados se tornaram comuns. Na impossibilidade de manter
a unidade política, mas percebendo a chance de preservar seus interesses
econômicos na Índia, desde que evitado um conflito interno de grandes
proporções, os ingleses propuseram a divisão da região em dois países: Índia e
Paquistão (ocidental e oriental). Milhões de pessoas foram forçadas a deixar
suas casas e cidades e a vivenciar um longo processo de migração, de um país
para outro, num processo onde os saques e ataques às populações minoritárias
foram uma constante.
Neste contexto é que encontramos o problema que envolve a
Caxemira, região ao norte da Índia, que faz fronteira com o Paquistão, região
na qual os líderes políticos aderiram à Índia, porém, onde a maioria da
população é muçulmana. A região é vista como ponto estratégico desde a Guerra Fria,
pois faz fronteira com o Tadjisquistão, então parte da União Soviética. Para a
Índia, preservar o território sobre seu controle, implicou ainda em inibir
outros possíveis movimentos separatistas, movimentos que normalmente utilizam a
religião como elemento de mobilização das populações.
Desde a independência e a formação dos Estados da Índia e do
Paquistão separadamente, a região foi palco de conflitos envolvendo os
muçulmanos - cerca de 80% da população - e os governantes hindus, entre 1948 e
49. Os rebelados tiveram apoio do governo do Paquistão e após a mediação da ONU
a região foi dividida em duas partes, uma sobre influência paquistanesa e outra
submetida ao governo indiano.
Em 1962 a Índia foi derrotada pela China e perdeu parte do
território da Caxemira, acentuando as divergências com o Paquistão, que
mantinha relações amistosas com a China. A tentativa paquistanesa de apoiar um
levante interno na Caxemira somente terminou com a mediação da ONU, em 1965.
Seis anos depois, a Índia apoiou o movimento de independência de Bengala,
província paquistanesa, que adotou o nome de República de Bangladesh, após a
derrota do Paquistão.
As disputas com nas quais a Índia se envolveu, internas e
externas, serviram de justificativa para o desenvolvimento tecnológico bélico
e, em 1974, o país realizou seu primeiro teste nuclear.
A década de 80 foi marcada pelo crescimento do
fundamentalismo muçulmano, fortalecendo o movimento separatista da Caxemira,
tanto por parte de grupos que surgiram na região, como de outros que se
desenvolveram no Paquistão. Dessa maneira formaram-se grupos guerrilheiros que
passaram a lutar pela independência, e que receberam apoio externo. Nos anos 90
os conflitos se intensificaram, envolvendo os guerrilheiros muçulmanos,
incluindo homens de diversas nacionalidades que se deslocaram para combater na
região, e o exército indiano, também fortalecido pelo fundamentalismo hindu,
refletindo uma situação de conflitos étnicos e religiosos generalizada,
responsável inclusive pelo assassinato de Rajiv Gandhi, durante campanha
eleitoral. As tensões internas caracterizadas por movimentos separatistas
fizeram com que o país vivesse um processo constante de militarização,
agravando a situação de miséria da população. O Paquistão sentindo-se
provocado, também desenvolveu tecnologia nuclear e realizou testes em 1988.
Atualmente a Índia controla dois terços da região e acusa o
Paquistão de treinar e armar os separatistas.
Fonte: www.historianet.com.br
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